domingo, janeiro 31, 2016

Vamos descobrir o que é o saber, sem saber...


Gordon Parks, Nova Iorque, 1943

S. — Pois, nesta minha arte de dar à luz, coexistem as outras todas que há na outra arte, diferindo não só no facto de serem homens a dar à luz e não mulheres, mas também no de tomar conta das almas e não dos corpos dos que estão a parir. E o mais importante desta fc] nossa arte está em poder verificar completamente se o pensamento do jovem pariu uma fantasia ou mentira, ou se foi capaz de gerar também uma autêntica verdade. Pois isto é o que justamente a minha arte partilha com a das parteiras: sou incapaz de produzir saberes. Mas disso já muitos me criticaram, pois faço perguntas aos outros, enquanto eu próprio não presto declarações sobre nada, porque nada tenho de sábio; e o que criticam é verdade. A causa disso é a seguinte: o deus que me obriga a fazer nascer, impediu-me de produzir, [d] Não sou, portanto, absolutamente nada sábio, nem tenho nenhuma descoberta que venha de mim, nascida da minha alma; mas aqueles que convivem comigo, a princípio alguns parecem de todo incapazes de aprender, mas, com o avanço do convívio, todos aqueles a quem o deus permite, é espantoso o quanto produzem, como eles próprios e os outros acham; sendo claro que nunca aprenderam nada disto por mim, mas descobriram por si próprios e deram à luz muitas e belas coisas. No entanto, o deus e eu é que fomos a causa do parto, [e] E isto é evidente; já muitos que o ignoram e atribuem a causa a si próprios, me olharam com desprezo, e, quer por convicção própria, quer persuadidos por outros, afastaram-se mais cedo do que deviam. Depois de se afastarem, fizeram abortar as coisas que ainda restavam, por causa das más companhias e, alimentando-as mal, destruíram as que eu tinha feito nascer, preferindo a mentira e as fantasias à verdade, acabando por parecer ignorantes, tanto a si próprios, como aos outros. (…)

Então, comecemos de novo, desde o início, Teeteto. Tenta definir o que pode ser o saber: do que não fores capaz, não digas nada. Mas decerto serás, se o deus quiser e te fizer homem.

Platão Teeteto, 150,c,d

As aporias do pensamento Socrático parecem-nos comuns porque nos habituámos a elas mas não deixam de ser estranhas se quisermos perceber o que são, descurando o fim, percebemos o fim, mas não percebemos o meio. Como pode alguém fazer nascer a verdade em alguém se não sabe em que consiste a verdade? Não é trabalho de parteira pois esta reconhece aquilo que vai ajudar a nascer, pois Sócrates não...

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